João Pedro Pais
Não conheço a totalidade da sua vasta obra. Felizmente, penso eu. Contudo, sinto-me suficientemente à vontade para desabafar convosco: este meu companheiro de estrada pelos acidentados caminhos da música é mais um transtorno-acumulador. Que espécie de reacção cutânea pode provocar num humano de constituição normal um refrão que diz "é mentira! é mentira!"? E se for repetido várias vezes, num prolongamento que excede - e com brutalidade - o limite da paciência e da tolerância auditiva? "É mentira! É mentira!"... além do mais é um plágio - ou seja, um transtorno-acumulador dentro de um outro transtorno-acumulador (ver post sobre "Plágio") - de uma cantiga popular portuguesa, que ia assim:
"é mentira, é mentira,
é mentira sim senhor,
eu nunca pedi um beijo,
quem mo deu foi meu amor"
Com vantagem para a cantiga popular pela superior complexidade lírica. Isto porque se depreende que JPP (não confundir com Pacheco Pereira, que esse não compõe. Ainda.) chega ao ponto do "É mentira!", esquece-se do que é que é mentira e repete, numa tentativa de recuperação da memória, "É mentira!". Mas nunca se chega a saber que raio de mentira é essa. No caso da cantiga, sabemos: é mentira que a sujeita pediu o beijo, tratou-se apenas de uma oferta singela, não de um pedido descarado.
João Pedro Pais é um ser irritante. E essa irritância é agravada pela atenção que lhe é dispensada pelas rádios e televisões portuguesas de cada vez que o trovador decide alimentar o mercado musical nacional com uma dúzia de reciclagens mal paridas de cançonetismo obsoleto, recheadas de verborreia que, sendo esforçadas, não chegam para ultrapassar um Tony de Matos ou um Carlos Mendes em matéria de romantismo. E que respeito merece uma personagem que canta para a sua amada qualquer coisa do género: eu sou "o átrio da escada para tu sentares"?! Mas que miúda será essa que se sente lisonjeada por ter à disposição "um átrio da escada" para se sentar? Porquê um átrio? Um átrio da escada?! Ó, caro amigo... ninguém se senta no átrio da escada a não ser que lá existam bancos, cadeiras ou sofás. E, nesse caso, a pessoa não se senta propriamente no "átrio da escada". Senta-se no objecto... "o átrio da escada para tu te sentares"... onde é que ele quer chegar com isto? Quer que a rapariga se sente no chão? Por que não "o degrau da escada para tu te sentares"?! Acho que fazia mais sentido. E sempre era mais confortável para a miúda, especialmente se a escada fosse de madeira e tivesse uma carpete fofa.