Querida Guitarra
sexta-feira, abril 30, 2004
  Trovador Errante
Atravesso actualmente uma fase de criação que me atrevo a classificar como "rica". Esta riqueza advém sobretudo dos pequenos grãos de sabedoria que humildemente fui reunindo no meu armazém dos conhecimentos - falo na perspectiva do criador, que o sou.

São alguns anos de estradas, aplausos e feedbacks nocivos ao aparelho auditivo. Os maços e maços de tabaco - que, depois de vazios e perfilados indianamente, perfariam uma carreira de mais de 370 metros de comprimento (se não contar com os maços de Marlboro 100's, que medem mais dois centímetros, aproximadamente) - revelam-se, com o passar dos anos, verdadeiros fardos de fumo e cinzas condensadas que me prejudicam a cadência respiratória e a capacidade de me auto-insuflar. A terra batida que eu já palmilhei, as tábuas de palco que eu já pisei...

Um artista - mesmo um artista como eu - tem momentos de lucidez. É então que decide fazer uma pausa, repensar as rotações a seleccionar no gira-discos da vida e concluir qualquer coisa. Eu concluí que a calma me faz falta. Pousarei os pés nesta terra quente e buscarei, atento mas em descanso, a minha própria iluminação. Acredito que a essência que me moveu durante a adolescência perturbada e rápida se mantém intacta. O que mudou foi a ânsia com que cuido dela: serenei. Doravante, tentarei saborear os dias como se cada um deles fosse uma travessa de caracóis, inofensiva e saborosa, numa esplanada de um litoral solarengo e manso.

O primeiro passo está dado: a guitarra está ensacada. Para já, dedicar-me-ei ao violão. A primeira composição acústica já está pronta e a letra reza em português. É um pouco autobiográfica, mas vale a pena. Chama-se "Trovador Errante". Não divulgarei o formato nem os acordes, uma vez que se trata de um inédito ainda por registar na SPA.

"Trovador Errante (Guitarrista)

Decadente e solitário
há quem me chame o mais errante trovador
escrevo a sós este diário
dedilhando a serpentina do amor
sem coragem nem destino
vou voando na vertigem do lugar
de um eterno feminino
doloroso que eu insisto em adorar
nas partidas que eu chorei
nunca foi vontade minha não voltar
e as musas que eu amei
esculpiram no meu corpo o seu cantar

(refrão)

hoje é dia de voltar p'ra casa
hoje é o dia do regresso aqui
hoje é dia de voltar p'ra casa
desde sempre
este é o dia em que eu vivi

comi pó com o coração
nos caminhos que iam dar a toda a parte
quis a purificação
desdenhei a glória efémera da arte
conheci gente maior
de entre a gente que povoa toda a Terra
fiz bandeira do amor
nas trincheiras em que a vida soa a guerra
nas manhãs em que acordei
solitário enfrentei em dó menor
solidões que eu dedilhei
sendo sempre o mais errante trovador

(refrão)

hoje é dia de voltar p'ra casa
hoje é o dia do regresso aqui
hoje é dia de voltar p'ra casa
desde sempre
este é o dia em que eu vivi"

Escusar-me-ei a interpretar esta letra, pois não subestimo as minhas duas leitoras.
Só espero que esta composição não esteja condenada à gaveta perpétua. Espero um dia ter o prazer e a honra de a interpretar frente a uma plateia repleta, comovida em silêncio.


 
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