Querida Guitarra
segunda-feira, junho 28, 2004
  Sexo
1. Estereótipos

Da mesma forma que um mundo inteiro pode ser organizado em top's, um universo - e todas as suas complexidades - pode ser etiquetado, empacotado, como se tudo fosse pré-formatado. Porém, nem sempre a estereotipagem é uma prática capaz de ilustrar uma completa realidade ou explicar, de um modo certeiro, uma verdade.

Uma amiga minha, que já não vejo há uns tempos e que, entretanto, se tornou praticante da menopausa, teve a bondade de me elucidar acerca de algumas coisas. Ou, pelo menos, esforçou-se por fazê-lo: "não gosto de poetas", disse ela, "os poetas fodem como mariquinhas" - isto são tudo palavras dela. "A melhor foda que levei foi de um enfermeiro... chamava-se Zé". O nome soou-me convenientemente vulgar, praticamente anónimo. "E digo isto dos poetas, mas posso dizê-lo dos artistas em geral. Os homens sensíveis são muito bons para fazer amor, mas muito maus para foder", sentenciou.

Obviamente, o raciocínio melindrou-me. Não sei se o conhecimento da anatomia contribui de alguma forma para uma melhor performance sexual. Não sei se o pragmatismo originário do hábito pela urgência será uma mais-valia, na medida em que os preliminares passam a adereço e, logo, são votados ao esquecimento - talvez a minha amiga não gostasse de preliminares, talvez fosse por demais objectiva quanto à satisfação dos desejos. Ou talvez não soubesse o que dizia - eu também sou capaz de saltar preliminares, dependendo da urgência da situação. E a anatomia não é propriamente um mistério apenas ao alcance de experts clínicos privilegiados. Talvez a minha amiga fosse virgem...

2. Tamanhos

Só a metafísica não tem medida. Porém, o tamanho da coisa em questão nunca foi para mim uma preocupação de substância. Pelo menos, até certo dia.

Eu andava com a Filipa. A relação ia avançando, a intimidade era cada vez maior. A nossa vida sexual era até bastante satisfatória. Uma vez - a última vez - estávamos em minha casa e, algures pelo meio de uma conversa, durante a pausa, a Filipa diz: "Sabes aquilo que dizem dos pretos? Pelo que experimentei, é verdade". Tentei manter-me sereno. Não sei se consegui. Continuou a Filipa: "Tive dois namorados mulatos e eram os dois..." interrompi-a "Filipa... por favor". "Oh, o que é que tem? Estamos só a conversar..."

Não voltei a ter relações com a Filipa. Não era capaz. Só me vinha à cabeça a ideia que, quando eu me despisse, ela iria pensar "mas por que é que eu não fiquei com o Adilson?" ou, enquanto eu estivesse dentro dela, lhe surgiriam lamentos interiores do tipo "Meu rico Reginaldo, que falta me fazias agora". Era insuportável para mim. Cheguei mesmo a imaginá-la na cama com o Adilson e o Reginaldo, cada um com suas carnes, penetrando-a insaciavelmente. Cada vez que pensava nisso, corava de vergonha e sentia que determinadas partes do meu corpo encolhiam, tornando-se cada vez mais ridiculamente pequenas. Passado uma semana, terminámos.

A Filipa nunca me chegou a dizer se eu era... bom... como dizê-lo?... vergonhosamente dotado ou confortavelmente constituído. Mas não me interessava sabê-lo. O facto de se ter lembrados dos dois "ex" mulatos só podia significar que eu não estava no seu top. Mas isso era irrelevante. Grave era o facto de tal se haver tornado uma memória "minha". Ou seja, as experiências passadas da Filipa passariam a fazer parte do meu quotidiano sempre que estivéssemos na cama: eu havia de lembrar-me do Adilson ou do Reginaldo, tenho a certeza, e sentir-me-ia ridículo. Foi esta a tormenta que levou a preocupar-me com o tamanho.

Não sei até que ponto a dimensão do objecto pode ser determinante no desempenho. A verdade é que as dimensões dos objectos costumam fazer a sua diferença, independentemente de ser para melhor, para pior ou simplesmente para... diferente. A outra verdade é que o tamanho faz mesmo diferença quando sabemos o tamanho dos outros - porque nos perturba (e o importante não é o "tamanho" propriamente dito, mas sim a consciência da existência de outros "tamanhos"; se a Filipa me tivesse contado que tinha ido para a cama com um chinês de 10 centímetros, eu iria ficar igualmente atormentado... imaginá-la-ia em loucos jogos de cama durante os quais ele havia... sei lá... de enfiar-lhe aquilo nas orelhas, por exemplo; e então eu seria incapaz de voltar a beijar-lhe as orelhas, seguramente, por melhor que ela cheirasse, por mais que me apetecesse fazê-la gemer só respirando-lhe ao ouvido).

Estas revelações são excrescências, informações que pecam pela demasia de desinteresse. Por vezes a ignorância é uma benesse para a paz interior. Que o diga a Filipa que, depois disto, chorou e ameaçou que se suicidava se eu não voltasse para ela. Felizmente, passados dois meses, encontrou o Sandro, um rapaz da Damaia.

3. Artes

Nós, os artistas, somos habitualmente conotados com uma vida sexual muito activa, fruto de uma vida boémia e noctívaga ou, simplesmente, de uma maior facilidade em encontrar parceria, tirando vantagem da notoriedade, da fama, do dinheiro, etc.

As coisas não são bem assim. Não basta ser um artista famoso para se ter uma multidão de mulheres atrás de nós. Há que ter cuidados com a imagem, definir um padrão para a personagem que queremos encarnar. Eu, por exemplo, gosto de ter um ar cool, não demasiadamente limpinho para realçar certos traços e, desse modo, reforçar a masculinidade. Mas não resulta com todos. Tenho amigos meus que chegam a passar semanas que na penúria.

Além disso, temos que ter cuidado com os enfermeiros, especialmente se forem mulatos. Pensem bem nisto antes de enveredarem por uma carreira que, embora à primeira imagem seja vistosa e tenha status, não é garante de coboiada diária e variada.
 
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