Discurso sobre a imortalidade
O Homem nasce para a imortalidade. Sim, existe para a morte, eu sei. E sim, encara a vida na perspectiva não de quem busca a imortalidade, mas antes na de quem foge da condição de mortal - o que, parecendo semelhante, acaba por ter as suas diferenças (se no primeiro caso, a atitude implica a aceitação da existência, tal como ela se nos apresenta, seguida de uma tentativa de superação (de si mesmo; da condição; do cosmos; do destino...), no segundo caso o acto e a postura não primam pela audácia, numa atitude global que acaba por poder traduzir-se em "fuga inconsequente").
Porém, não deixa o Homem de desejar a imortalidade - mesmo ignorando que nasceu para lutar por ela.
Eu considero quatro estados de existência perante a imortalidade:
1) o que é imortal;
2) o que conquista a imortalidade;
3) o que deveria ter-se tornado imortal*;
4) o que ignora e nem se rala.
(*perspectiva exterior; casos normalmente recordados em cerimónias fúnebres por gente enfadonha que proclama, levianamente, "gente desta não devia morrer"; toda a "gente" que é etiquetada como "gente desta" não deveria, sequer, ter lugar perante a opinião pública.)
Penso muito na minha própria imortalidade. O que será isso? Ser recordado, no futuro, pelos descendentes dos humanos de hoje? Por seres de outras espécies? Perdurar, deixar uma imagem que não sucumba aos tempos? Sim, é apenas esta a imortalidade que considero: a da memória. Não levo em conta as teses que defendem as "imortalidades" quer física quer espiritual.
Eu quero ser como um monumento. Uma coisa que fica.