Isto levava-nos muito longe... Discussões destas animaram por muitas noites a célebre Tertúlia que se reunia no Snack-Bar O 18, ali ao Largo da Paz, na Ajuda. Toda a gente se lembra da brilhante intervenção do grande Serafim Madeiro, espírito insígne, fígado estragado, bigode constantemente com restos de gemas de ovo cozido: "Eu, cá para mim, isso da arte é um mistério.". Notável Serafim, capaz de dizer tanto com tão pouco. E arrotava a Marselhesa toda sem perder o tom. Quem também se manifestou foi o Nélson Carranca, filho de industriais de mármores de Estremoz, homem de letras e de outros títulos de dívida: "A verdadeira arte é uma corruptela do espírito. O corpo asnifica-nos e o espírito rebela-se e materializa-se numa de duas formas: ou na arte ou em psoríase." Bom homem, o Nélson, mas de más contas e com um piquinho a azedo. Outro dos grandes vultos do 18 era o Jacinto Herculano, homem mais velho mas nem por isso menos bêbedo. Ficou célebre a sua frase, que chegou a sair no Boletim da Junta de Freguesia da Ajuda, sobre a verdade da arte: "Ó minha querida Arte!, Ó Arte que és meu viver!, Antes morrer de enfarte que não ter como te conhecer! És melíflua e insidiosa; enganas toda e qualquer premissa para te assumires como és, ó promessa intangível de condição superior!". Era assim, o Jacinto. Nunca ultrapassara o trauma dos anos de Seminário, sempre empolado e com uma garrafinha de vinho da missa debaixo do casaco. Bons tempos, os do 18...